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Fel-da-terra

 

Fel da terra

É apaixonante visitar o mesmo local da floresta, da charneca ou da campina inculta em diferentes épocas do ano. A vegetação silvestre vai-se manifestando de diversas maneiras, seduzindo os seus apreciadores. Varia também consoante as alterações meteorológicas. Como se sabe, a característica principal do nosso clima atlântico-mediterrânico é a da irregularidade. Isso é de tal maneira flagrante que chega a contrariar, em absoluto, os provérbios tradicionais. Veja-se aquele que estipula “em abril águas mil coadas por um funil”. Pois é, mas neste mês de abril da graça do senhor de 2017, só choveu, e muito ligeiramente, no dia 30. A secura inusitada do início de primavera forçou as plantas a apressar o seu ciclo de vida e a amadurecer mais cedo para transmitirem descendência e assim propagarem as espécies.

No princípio do mês fui, de propósito, ao Pinhal das Formas colher folhas de cardo-mariano e fiquei deslumbrado com a profusão de azuis proporcionados pelas ervas-das-sete-sangrias. Já em maio, as citadas flores tinham desaparecido e o que sobressaia eram as hastes floridas do fel-da-terra salpicando os campos de rosas e amarelos. Fiquei maravilhado porque as flores são lindas!

Antes de florir, ninguém vê o fel-da-terra porque a planta é minúscula. Depois ergue-se uma haste de 10 a 40 cm e surgem flores inconfundíveis com pétalas cor-de-rosa vivo e corolas amarelas. Há ainda outra maneira de o identificar: basta provar uma das folhinhas que é amarga como o fel, o que originou um dos seus nomes mais populares. Em muitas línguas europeias também é conhecido por centáurea, pequena centáurea, centáurea-menor, planta-da-febre ou erva-febrífuga.

Há várias designações científicas para o fel-da-terra: Centaurium erythraea, Centaurium minus, Centaurium umbellatum, Centaurium erytbraea, etc., sem contar com inúmeras subespécies que pouco divergem entre si.

É uma herbácea da família das Gencianáceas, quase sempre anual, com folhas basais em roseta, caule solitário, glabro, quadrangular, ramificado na extremidade e possuindo pequenas folhas sésseis, opostas e oblongas. As flores, de cinco pétalas, são rosadas e por vezes esbranquiçadas, dispondo-se nos ramos como se fossem lâmpadas de um candelabro. As sementes inserem-se numa cápsula alongada.

Empregada desde remotas eras para baixar a febre (antipirética), parece que serviu, como conta a lenda, para cicatrizar a ferida causada inadvertidamente num pé de Hércules, pelo centauro Quíron, ou vice-versa, já não sei bem.

Entre os principais componentes químicos do fel-da-terra, temos, em primeiro lugar, os glucósidos amargos e depois, as resinas, os flavonóides, o magnésio, os sais minerais, o óleo essencial e várias estirpes de ácidos.

Para além de ser antipirética e cicatrizante, a planta é tónica, estomacal, laxante, depurativa do sangue, estimulante da secreção gástrica, anti-inflamatória, anti-artrítica, analgésica, carminativa e vermífuga.

Combate úlceras, feridas e eczemas através de cataplasmas da planta inteira colocada em cima das partes doentes. Para uso interno pode ser extremamente útil nos casos de falta de apetite e anorexia, digestões pesadas, flatulências, insuficiência hepática, prisão do ventre, vermes intestinais, diabetes, etc.

É também muito utilizada em preparados homeopáticos.

Oliveira Feijão recomenda o infuso de 30 g de fel-da-terra num litro de água, a tintura (2 a 10 g por dia) e o “vinho” obtido da maceração, durante duas semanas, de 60 g das sumidades floridas num litro de vinho moscatel. Tomar no intervalo das refeições.

Jamais se deve adoçar o “chá” porque a bebida é tão amarga que o açúcar não a faz mais apetecível, pelo contrário, torna-a até deveras enjoativa.

Samuel Maia, no seu antiquíssimo “Manual de Medicina Doméstica”, indica-nos um laxante assaz curioso: 4 g de sumidades secas pulverizadas em miolo de pão ou hóstia.

Finalmente, uma precaução a ter em conta: o uso prolongado do fel-da-terra pode causar irritação das mucosas gastrointestinais. Como na maior parte dos tónicos amargos, devemos espaçar os tratamentos, descansando uma semana, após dez dias seguidos de uso.

Miguel Boieiro

 

 

LMAM Publicado em 10 maio 2017
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